R$ 10,80. Foi esse o preço de um tempo pra mim. Em plena segunda feira, quando é oficialmente aberta a temporada semanal de correr atrás, um cliente com quem marquei uma reunião às 10 se sentiu mal e não foi ao escritório. Sua secretária me ligou exatamente quando eu estava entrando no metrô, a ligação entrou na secretaria eletrônica, o que só percebi quando saía do escritório onde a reunião deveria ter acontecido. Acontece, confesso que ainda vejo como uma possibilidade de melhorar uns pontos da minha apresentação.
A partir deste ponto retomo o planejamento do dia. Como disse um amigo, tempo e espaço são coisas que, assim que temos, não temos mais. Com esse cancelamento se abriu uma hora no meu dia, e antes de arranjar uma utilização produtiva no sentido capitalista-burguês, decidi me dar um café de presente. Nunca imaginei que se tornaria uma decisão tão produtiva num sentido mais zen-vagabundista.
Eu não vou ficar aqui fazendo propaganda do estabelecimento, até porque R$10,80 por um expresso e um pão de queijo não é nenhuma barganha. No segundo andar tinha espaço para sentar, e ao me deparar com o ar-condicionado, a música ambiente e aquela paz em pleno Centro, eu já tinha abandonado o plano de rever a lista de tarefas do dia. Tinha um bando trabalhando em notebooks ou tablets, outros no celular enquanto tomavam o seu café e alguns no que parecia uma reunião com tons mais informais. Se fui recebido neste ambiente com Chico Buarque cantando “Quando o Carnaval chegar”, percebi que existia uma oportunidade a ser aproveitada. Era um pequeno oásis em plena Rio Branco, e não sei se o fato de ser segunda-feira de manhã tornava o Centro um pouco menos caótico e sujo do que o usual, mas esse pequeno distanciamento ajudava.
Reconheço “Manhã de Carnaval”, apesar que só o aplicativo me esclareceu que é a versão de Luiz Bonfa, mas já me sentia genial por saber de ouvido mais essa música. Esse clima me faz escrever este texto, que nem sei onde vou publicar ou mesmo se vou publicar. A lista de tarefas pode ser atualizada no metrô ou no coworking, eu não podia perder essa chance de retomar um pouco de sanidade e pensar na vida. Confesso até que vou ficar de olho no espaço para outras oportunidades, não sei se em outros horários se mantém a paz que encontrei agora. A ideia de trabalhar daqui é um símbolo da gig economy, mas confesso que ainda não me sinto confortável para isso. Uma moça levantou para ir ao banheiro ou renovar seu café, e fiquei tomando conta do seu notebook solitário em cima da mesa compartilhada. Acho até que posso atualizar alguma coisa num espaço desses, mas nada que passe de 40 minutos. Talvez seja bom exatamente para ler e espairecer um pouco.
“Chô-chuá” ajudava a esquecer aquelas pressões da vida adulta, e Joyce com a sua “Clara e Ana” apagou temporariamente as contas e os prazos. E é como meditar: quando a gente acaba de fazer é incrível, é uma mudança de vida, é coisa óbvia para melhorar o cotidiano, mas fica pra depois na primeira semana. Agora, em casa, depois de botar as crianças pra dormir, tento finalizar esse texto pensando como esse episódio foi o ponto alto da semana sem mesmo a semana começar. Aí a gente faz promessas amor, jura felicidade e promete se dar esse tempo sempre, para poder ter esse suspiro de clareza de pensamento. E mesmo lembrando como é difícil, faço uma promessa silenciosa que vou fazer acontecer. Ah, e vou voltar a meditar também.
Publicado no Medium em 20 de maio de 2019 https://medium.com/@joaoepfp/comprei-paz-de-esp%C3%ADrito-por-r-10-80-135517ff4554
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